sexta-feira, 24 de junho de 2011

Cinema: Um Novo Despertar (The Beaver, 2011)

Este não é só um retrato de Walter Black, é um retrato de uma triste sociedade moderna.

por Fernando Labanca



De inúmeros escândalos em sua vida pessoal, Mel Gibson se tornou alvo de polêmicas e muitos viram "Um Novo Despertar" como sua redenção, um ato de uma grande amiga, no caso, Jodie Foster, a diretora, de reerguê-lo provando seu talento como ator, infelizmente muitos não conseguiram ir muito além disso, veem como um mero filme de um ator tentando retornar a carreira, muitos nem assistiram como se o ato de assistir fosse como uma aprovação a suas atitudes. Há ainda críticos que avaliam a obra levando em consideração a vida pessoal de Gibson, o que é patético e nem um pouco profissional. Enfim, o filme fora aplaudido de pé recentemente no Festival de Cannes, e marca a realização de uma diretora promissora e de um ator que ainda pode fazer e muito ao cinema.

Na história, conhecemos esse tal de Walter Black (Gibson), um cara perdido em sua própria existência, com sua alma morta e sem nenhuma motivação para querer viver, acaba passando este modo depressivo de encarar seus dias para as pessoas ao seu redor, não consegue mais ter idéias para alavancar sua empresa na qual é diretor e muito menos ser um pai e um esposo presente. Como única saída, sua mulher, Meredith (Jodie Foster) o expulsa de casa. A trama começa com sua saída e suas tentativas frustrada em cometar suicídio num quarto de hotel, é quando se depara, jogado no lixo, com um fantoche de castor, coloca em seu braço e passa a usá-lo com um alter-ego, como algo para enfim lhe salvar, salvar seu coração morto e vazio, como se precisasse que algo o representasse e lhe dissesse o que era preciso para acreditar na vida novamente.

Como castor, Walter reencontra seu filho mais novo (Riley Thomas Stewart) que passa a adorar a nova personalidade do pai, que fala, que sonha, que brinca, e aos poucos retorna para sua casa, volta a ser homem de verdade, reconquista Meredith que jamais quis abandoná-lo, pelo contrário, sempre arranja forças para apoiá-lo, além de criar novas e brilhantes idéias em sua empresa, e tudo isso, com o pretexto de que o fantoche fora ideia de seu psicólogo como forma de tratamento. O problema é que seu filho mais velho, Porter (Anton Yelchin) não aceita seu retorno, enquanto isso, ganha a vida fazendo lições para outros alunos, é quando aparece Norah (Jennifer Lawrence) que faria o discurso de formatura e lhe pede ajuda, para dizer o que não conseguia, lhe permitindo entrar em sua vida, e nisso ele descobre alguns segredos de seu passado. E Walter tenta se aproximar de Porter sem saber o quão complexa e depressiva é a mente de seu filho distante.


Imagine ver um filme onde o protagonista passa a maior parte do tempo com um fantoche nos braços, falando com outra voz, e agindo como se estivesse atuando diante de todos! Ok, pode parecer bizarro, aliás, de fato é muito bizarro e muito estranho, mas o que vale mesmo é a intenção, "Um Novo Despertar" é um projeto único, que se arrisca, vai muito além do que se espera de um filme, é algo muito novo, fiquei extremamente contente ao me deparar com essa situação tão diferente, tão fora do habitual. É tão bom ver o cinema provando novas possibilidades e no meio de tantos blockbusters surgindo nas telas, só posso dizer que este veio na hora certa, um alívio.

A idéia é bizarra, mas é fantástica. Walter Black é um grande personagem, a maneira como o roteiro trabalha sua trajetória é algo tão novo e ao mesmo tempo tão belo e complexo, às vezes a trama parece previsível, mas não é, parece só uma história boba sobre redenção, mas vai muito além disso e por isso surpreende. Os conflitos que vão sendo mostrados são extremamente interessantes, gosto da maneira como esta "redenção" de Walter Black é trabalhada, não é aquele homem deprimido que simplesmente se salva e tudo vai ficando bem, ele é complexo demais para se limitar a isso, em uma das cenas no qual me emocionei muito, Meredith acreditando em sua salvação lhe mostra fotos da família e este enlouquece, não por odiar a família, mas por sofrer ao se lembrar o quão mal aquele homem do passado fez aqueles que amava. Não é bem sobre redenção, quase não há, na verdade, e por isso é tão inteligente e original, é um longo processo de aceitação como pessoa, a depressão simplesmente não some, ela o acompanha em toda sua jornada, não é aquele filme de motivação que lhe diz "vai ficar tudo bem no final", é uma obra melancólica que nos mostra que é uma mentira nos dizer que vai ficar tudo bem, a tristeza, a infelicidade existe, é real, nos acompanha.

Sim, Mel Gibson dá um show, independente do que ele faz em sua vida pessoal, é um grande ator e aqui mostra seu talento, dá o tom certo de humor e melancolia necessário pra compor Walter e nos emociona intensamente com seu olhar vazio e sua alma fragmentada. Jodie Foster deixou o astro brilhar na tela, logo, se permitiu ser uma coadjuvante, uma incrível coadjuvante, aliás, que comove e também dá um belo show em determinadas cenas. O elenco jovem não desaponta, Anton Yelchin, com personagem de destaque na trama, surpreende e Jennifer Lawrence encanta com seu carisma e seu talento de sobra, sua personagem parece um pouco perdida na história, mas se refletido, percebemos que há uma bela sacada na construção de Norah, logo que assim como Walter Black, ela também precisa de alguém para dizer o que sente e assim se descobrir como pessoa. Genial. Com um elenco desses, não poderia dar errado, se empenham ao máximo para fazer uma obra de qualidade e com suas interpretações, Jodie Foster como diretora, constrói cenas marcantes, confesso que derramei algumas lágrimas, há belos discursos, diálogos bem pensados e um final belíssimo.

"Um Novo Despertar" é uma obra incrível, ao terminar, fiquei realmente sem palavras, estático em minha poltrona, tentando digerir toda aquela complexidade e intensidade, que vai fundo na alma de cada personagem, onde cada um tem um drama escondido que aos poucos vai sendo trabalhado, e tudo vai sendo guiado e mostrado de forma tão única, tão nova, que emociona e nos faz refletir sobre tantas coisas. Havia tempo em que não via um drama familiar tão bom quanto este. Uma hora ou outra, Hollywood produz grandiosos filmes, e este, de fato, é um deles, simples no formato, há poucas locações, poucos cenários, mas a idéia e a maneira como ela é mostrada faz de "Um Novo Despertar" um projeto rico, inovador, e acima de tudo, uma obra sincera, humana e que mexe com os sentimentos mais profundos. Não recomendo para todos, logo que não se trata de algo muito convensional. Mas ao meu ver, é digno de palmas.

NOTA: 9,5


Um comentário:

  1. Caramba! Vc viu e gostou mesmo!!!
    Mas mesmo assim não pretendo ver por enquanto...ainda acho muito bizarro e tem cara de filme melodramático...
    Mas enfim, parabéns pelo texto!

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